REDUZINDO RISCOS NA PILOTAGEM
Pilotar uma motocicleta é a
melhor coisa da vida que pode ser feita em público. Por outro lado, se você não conhecer a
técnica correta para pilotar a sua máquina o que deveria ser um prazer, a
qualquer momento pode se transformar em um sério problema. O pior de tudo é que
pouquíssimas pessoas reconhecem a necessidade de buscar ajuda e quando o fazem,
quase sempre procuram as pessoas erradas.
No meu caso dei uma sorte muito
grande. Resolvi comprar uma motocicleta, uma Vulcan Classic 800, 3 ou 4 anos
trás. Comecei como a maioria, achando que sabendo dirigir automóvel e bicicleta
estaria automaticamente graduado. Passei por inúmeros “sufocos” e descobri,
após uma viagem a Minas sozinho, que não sabia nada sobre a matéria.
Busquei
ajuda na Internet e baixei um livro que, embora sobre motos “speed”, me deu algumas dicas fundamentais e onde fui apresentado ao “contra-esterço”.
Após 8 meses com a Vulcan comprei uma Harley Davidson Road King Classic.
Trouxe-a para Cabo Frio e após uma semana resolvi vende-la: cheguei à conclusão
que jamais a dominaria. Um amigo, ao saber do motivo da venda, apresentou-me ao
Comandante Cyro França que se dispôs a ensinar-me a Técnica das Polícias
Americana e Canadense. Começamos no mesmo dia e após 3 ou 4 aulas desisti
definitivamente de vender a moto e pela primeira vez me senti completamente
seguro.
Continuei tomando aulas e praticando manobras em baixa velocidade,
depois na estrada fazendo curvas em velocidades mais altas até que, com menos
de 8 meses, viajei para a California onde aluguei uma HD Ultra Classic e “fiz” 20 dias de “Route 66” cruzando os desertos de
Mojave e Arizona, atravessando o “Death Valley”, perdendo uns dólares em Las
Vegas, conhecendo o Zion National Park, Gran
Cannyon, Bagdad Café, etc... Tudo isso sozinho,
enfrentando chuva e frio em algumas ocasiões, transito pesado nas cidades em
outras, e sem nenhum contratempo. Aproveitando ao final para fazer o curso do
Jerry Paladino (Ride Like a Pro) em Los Angeles e constatar que as aulas do
Comandante Cyro eram bem mais completas e didáticas.
Assim é que continuo aprendendo,
treinando, fazendo cursos, lendo e colocando em prática os conhecimentos que
venho adquirindo e, em especial, as aulas do Comandante Cyro com quem tive o
prazer e o privilégio de formar uma parelha, com duas veteranas Gold Wing, e
rodarmos pela Virginia, North Carolina, Tennessee, New York, Maryland, West
Virginia, Ohio, Pennsylvania e Michigan, onde o ponto alto foi uma louca
disparada pelo famoso “Tail of the Dragon” onde os limites de velocidade foram
excedidos, confesso envergonhado.
Fruto de todo ensinamento que
recebo e recebi, tentei colocar em forma de artigo informações que, espero
sinceramente, ser de alguma utilidade.
REDUÇÃO DOS NÍVEIS
DE RISCO
Antes de mais nada temos que
definir o que é risco e como medi-lo. Em se tratando de pilotagem de
motocicletas, podemos dizer que risco é a possibilidade de nos envolver em um acidente
devido a um PROBLEMA surgido em nosso
percurso. Problema este que pode ser óleo, areia, lama ou interdição na pista; veículos
quebrados/parados; curvas que requerem velocidades mais baixas; etc...
Naturalmente que o piloto, de acordo com seu nível de competência e com a
natureza do problema, buscará uma SOLUÇÃO
que exigirá TEMPO e ESPAÇO para ser executada
com sucesso.
Isto nos permite dizer que, entre
o momento em que o PROBLEMA for identificado e a MOTOCICLETA devem existir TEMPO e ESPAÇO suficientes para o piloto
executar a SOLUÇÃO (freiar, desviar, acelerar ou qualquer outra que julgar
adequada).
Portanto, para avaliarmos o Nível
de Risco de nossa pilotagem devemos medir os componentes TEMPO e ESPAÇO existente entre a
motocicleta e a nossa capacidade de perceber o PROBLEMA. O Nível de Risco aumenta na razão inversa da
redução desses dois fatores. Quanto mais
reduzido for o tempo e o espaço
entre você e o problema maior será o Nível de Risco de sua pilotagem.
Vamos tentar exemplificar.
Imagine que você esteja pilotando, dentro dos limites legais da estrada, em uma
reta e nessa reta exista um veículo acidentado obstruindo a pista. Este
problema requer que você encontre e ponha em prática uma solução. Seja qual for
a solução encontrada você precisará de TEMPO e ESPAÇO para executar a manobra
adequada. A diferença entre sucesso e desastre serão os metros e frações de
segundo disponíveis para o procedimento.
A responsabilidade por criar este
verdadeiro Espaço Vital é unicamente do motociclista, através de uma postura
que deveria ser ensinada antes de qualquer outra coisa e onde três ações devem
ser destacadas: PERCEPÇÃO, DECISÃO e
EXECUÇÃO.
PERCEPÇÃO:
Esta é a mais importante das
ações. Quanto mais cedo você perceber um problema ou a simples possibilidade de
sua ocorrência, mais tempo e espaço você terá para as duas outras ações:
DECISÃO e EXECUÇÂO.
Não por acaso os bons pilotos
olham 2 ou 3 segundos à frente,
antecipando o que será necessário fazer para alcançar aquele ponto. Parece uma coisa difícil mas se
você praticar torna-se automático. O seu
olhar deve funcionar como a luz dos
faróis de um carro: não se fixam num
objeto mas sim estão sempre à frente varrendo a estrada. Você deve utilizar
igualmente, a visão periférica com a
qual perceberá os obstáculos mais próximos sem necessidade de desviar o foco
que estará à frente.
Existem exercícios para aprimorar
(na realidade aprender a utilizar) a visão periférica que ajudam muito. Por
exemplo, sentado em uma mesa com vários objetos em volta e olhando, sem desviar
o foco, um ponto fixo à frente mover as mãos e pegar os objetos sobre a mesa.
Olhar os veículos que estão bem à
frente muitas vezes nos ajuda a perceber obstáculos que a vista ainda não
alcança, seja através da luz de freio, algum solavanco, fumaça de pneus, ou
mesmo um desvio brusco. Com o tempo, e exercitando sempre, adquirimos uma
capacidade de percepção que irá nos livrar de muitos problemas. Animais nas
margens da pista, veículos no
acostamento ou parados em cruzamentos e interseções devem ser considerados
problemas em potencial.
DECISÃO:
Neste ponto, após ter PERCEBIDO o
problema, considerando o espaço e o tempo disponível você DECIDIRÁ qual a
solução a ser EXECUTADA. Lembre-se que a moto continua rodando comendo metros e
frações de segundo que podem fazer toda a diferença, quanto mais rápido você
der início à EXECUÇÂO do procedimento maior será a probabilidade de sucesso.
Dito assim parece difícil ou
mesmo impossível de ser feito mas não é. Antes de mais nada você deve conhecer
os fundamentos básicos de pilotagem (Frenagens, Contra-esterço, Olhar, Postura,
Curvas em baixa velocidade, etc...) e, principalmente, que você tenha um
programa de treinamento que simule situações imprevistas (falaremos disso mais
tarde), você vai incorporando manobras e procedimentos de segurança que, pela
repetição, seus músculos acabam por memorizar se transformando em reflexos.
Uma ótima maneira de simular
situações de risco em segurança é o chamado Treinamento Mental. Sentado em uma
cadeira confortável em um local sossegado em sua casa, feche os olhos e imagine
que está pilotando sua moto, procure imaginar o som do motor, os pneus girando
no asfalto e de repente uma situação de risco, por exemplo um carro quebrado
após uma lombada. Imagine uma solução e realize as manobras mentalmente. É um
ótimo exercício pois nos leva e desenvolver soluções para as situações mais
inusitadas em completa segurança. Mais tarde você coloca-as em prática em um
local seguro onde você poderá verificar o espaço e o tempo requerido para sua
conclusão, ajudando-o a conhecer ainda mais sua motocicleta.
Uma dica fundamental é que após você decidir por um procedimento jamais
desista dele. Leve-o até o fim.
EXECUÇÃO:
Já que o problema foi PERCEBIDO e
uma solução foi DECIDIDA, se ambas as
ações foram realizadas em tempo hábil e você vinha pilotando
mantendo um Nível de Risco adequado, ou seja: com TEMPO e ESPAÇO suficientes
para as três etapas: PERCEPÇÃO – DECISÃO - EXECUÇÃO, esta é a etapa
mais fácil, basta que você coloque em prática a sua habilidade como
motociclista para contornar a situação com sucesso
Além da manobra propriamente dita,
existem dois aspectos fundamentais que não podem ser negligenciados , especialmente neste momento : RESPIRAÇÃO e OLHAR.
RESPIRAÇÃO: Como todos que
passamos por situações estressantes e recebem uma descarga de adrenalina,
tendemos a contrair os músculos, trincar os dentes e bloquear a respiração. Isto
é altamente prejudicial em todos os sentidos pois acaba prejudicando a
oxigenação do cérebro afetando nossos reflexos. O que aprendi é que, em
situações como essas, ao PERCEBER o problema, começo a inspirar pelo nariz e
expirar pela boca, como um atleta. Isto funciona muito bem comigo evitando uma
elevação dos batimentos cardíacos. Aliás, sempre que vou fazer uma manobra um
pouco mais complicada passo a respirar como um atleta garantindo uma oxigenação
adequada.
OLHAR: Uma verdade que
aprendi é que a motocicleta vai para onde olhamos, é inevitável. Se você olha para o acostamento ou para o
carro que vem em sentido contrário, você é atraído para eles como se foram imãs. Se você está numa curva e deixa de olhar para
o ponto onde quer que a moto vá e olhar para a pista contrária, esteja certo de
que você invadirá a pista contrária. No
presente caso, você identificou um PROBLEMA, DECIDIU o que fazer e está
EXECUTANDO a manobra que o livrará do PROBLEMA. Não olhe para o PROBLEMA mas sim para onde quer que a manobra
leve a moto pois lá está a SOLUÇÃO !
Olhe para a SOLUÇÃO, jamais para o PROBLEMA
!
Naturalmente que a capacidade de
executar estas 3 etapas variam de motociclista para motociclista cabendo a cada um de nós conhecer e estabelecer nossos próprios limites. As diferenças podem se tornar perigosas quando
se anda em grupos pois algumas vezes colocam motociclistas experientes “puxando”
o “bonde” obrigando, eventualmente, outros motociclistas a pilotarem acima de
seus limites.
Um outro aspecto interessante é o
Nível de Risco que a pessoa está disposta a assumir. Conheço motociclistas que
fazem uma determinada curva a 140 Km/h, no limite. Sei que tenho habilidade e
competência para faze-lo mas prefiro contorna-la a 110 Km/h, tenho como padrão
andar entre 70% a 80% do meu limite deixando uma margem de segurança. Tem sido
saudável.
Se eu pudesse dar uma sugestão
para meus irmãos motociclistas diria o seguinte: Faça da pilotagem de sua moto um prazer,
andando da forma e na velocidade que você julgar a mais adequada. Não tema
abandonar um comboio se você não está disposto a assumir um Nivel de Risco que
não é o seu.
Referências Bibliográficas:
WWW.aviaomotoskill.com - Com. Cyro França
Ride Like a Pro – Jerry Palladino
Maximum Control – Pat Hahn
Proficient Motorcycling – David L. Hough
A Twist of the Wrist II – Keith Code
Street Strategies – David L. Hough
Motorcycling Excellence – The Motorcycle Safety Foundation’s Guide
4 comentários:
Dois detalhes me chamaram a atenção: a respiração que tento controlar e pensava ser um característica minha e a decisão de aumentar os limites para minha segurança.
Bom saber que o controle da respiração realmente faz diferença e que não sou apenas eu que pensa na diminuição voluntária dos limites em prol da segurança pessoal.
E vamos manter as motos rodando!
Grande Wolfmann,
esse lance da respiração ocorre com uma frequência muito grande. Já ví um aluno do Cyro parar a moto dizendo que estava com falta de ar e o coração disparado. Quanto a reduzir voluntariamente os limites é o que me indica o bom senso, afinal quero andar de moto por muitos anos ainda. Obrigado pelas palavras e um grande abraço
Helio
Gosto muito das suas dicas e procuro colocá-las em prática. Gostei da referencia ao Cmte Cyro, pois aprendi muito com ele também.
Abrção
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chico
Amigo Chico,
é um privilégio saber que você é um leitor de minhas "mal traçadas". Realmente o Com. Cyro é uma referência para muitos motociclistas e nada mais fiz do que reconhecer a ajuda que ele me deu.
Grande abraço.
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